Maduro prendeu pelo menos 120 adolescentes em menos de um
mês. A maioria oriunda de bairros de classe trabalhadora, bastiões históricos
de apoio a Chávez e Maduro que parecem ter aderido à oposição no mês passado. A
nenhum foi concedido acesso a um advogado privado, afirma o grupo de
assistência jurídica pro bono Foro Penal. Muitos ficaram presos pelo menos uma
semana até que lhes fosse permitido entrar em contato com suas famílias.
O número de menores presos ultrapassou até mesmo o das mais
notórias campanhas repressivas da região. A ditadura argentina dos anos 70 e 80
prendeu 151 em sete anos. O regime do ditador chileno Augusto Pinochet prendeu
956 menores de 1974 a 1990, ou cerca de 56 por ano.
A Venezuela experimentou ondas de agitação e detenções em
massa no passado; Maduro já era investigado pelo Tribunal Penal Internacional
por supostos assassinatos extrajudiciais e tortura de oponentes políticos. Mas
grupos de defesa de direitos humanos afirmam que a atual campanha é a que
registra mais presos políticos.
Detalhes
Era por volta de 1h quando 17 oficiais militares de
contrainteligência bateram à porta da residência de uma família e foram
entrando. Os agentes apontaram fuzis contra uma mulher de 40 anos e seu filho
de 5, disse ela ao Washington Post. Eles prensaram contra parede seu filho de
15 anos, o algemaram e passaram a estapear sua cara até ele revelar o nome de
um amigo. E o arrastaram para dentro de uma van.
Posteriormente, o adolescente contou para a mãe que os
militares o espancaram, pisotearam sua cabeça e chutaram seu corpo. Ele lhe
disse que foi atingido no tórax, nas costelas e nos braços.
Mãe e filho conversaram com o Washington Post sob condição
de anonimato porque o adolescente recebeu ameaças de morte.
A mulher e seu filho de 5 anos passaram a noite na cadeia,
mas o jovem de 15 anos ficou preso 20 dias. E foi impedido de receber visitas
da família por uma semana.
Procurado, o procurador-geral Tarek William Saab, principal
autoridade policial da Venezuela, não respondeu a um pedido de comentário.
Esse adolescente é um entre pelo menos 120 menores que
foram presos pelas forças de segurança de Nicolás Maduro desde que o autocrata
socialista proclamou-se reeleito no mês passado, de acordo com várias
organizações de defesa de direitos humanos.
Os menores estão entre as mais de 1,6 mil pessoas presas —
capturadas nos protestos ou nas proximidades ou levadas de suas residências no
meio da noite — em muitos casos, sem mandados. Seus advogados também têm sido
alvo.
“As forças de segurança estão detendo pessoas a uma
velocidade que nós nunca tínhamos visto na história recente da Venezuela, nem
mesmo durante as brutais repressões de 2014 e 2017″, afirmou a diretora para as
Américas da ONG Human Rights Watch, Juanita Goebertus. “Não se trata apenas de
repressão contra manifestantes. Há uma caça às bruxas total contra qualquer um
que ouse criticar o governo.”
A oposição venezuelana, o governo Joe Biden e líderes
latino-americanos e de todo o Ocidente acusam Maduro de fraude eleitoral. Uma
análise do Post de atas eleitorais impressas por máquinas de votação coletadas
por observadores eleitorais da oposição indica que seu principal desafiante,
Edmundo González, recebeu mais que o dobro de votos na eleição de 28 de julho.
Todos os menores, afirmam advogados defensores de direitos
humanos, foram acusados de terrorismo. Mais de 100 seguem sob custódia.
O Post entrevistou cinco famílias que afirmam que seus
adolescentes foram presos. O Post não conseguiu verificar independentemente
suas afirmações.
Todos foram levados para instalações de detenção juvenil,
sob estrito controle militar, afirmam os denunciantes. Alguns foram forçados a
saudar uma foto de Maduro e pronunciar a expressão “Chávez vive”, em homenagem
a Hugo Chávez, o finado fundador do Estado socialista da Venezuela.
Todos os adolescentes disseram às suas famílias que
sofreram agressões físicas. Quando se comportavam mal, afirmaram, suas visitas
e refeições eram restringidas.
Todas as famílias, localizadas pelo Post por meio de
organizações de defesa de direitos humanos e da cobertura da imprensa, falaram
com a reportagem sob condição de anonimato em razão de preocupações com sua
segurança.
No dia seguinte à declaração da vitória de Maduro por parte
do conselho eleitoral, controlado pelo presidente, a Venezuela se ergueu em
protestos. Maduro, que havia ameaçado o país com um “banho de sangue” caso não
vencesse, respondeu prendendo opositores e qualquer pessoa suspeita de
participar dos protestos. Pelo menos duas dúzias de venezuelanos foram mortos a
tiros; uma deles tinha 15 anos.
Fonte: Estadão Conteúdo
Foto: The New York Times