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segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

“Não basta ter infraestrutura, é preciso saber usar”, afirma especialista da UFRN sobre segurança viária em Natal


 A morte do médico e ciclista Araken Britto, em um trágico acidente na manhã desta segunda-feira (24), na Avenida Senador Salgado Filho, em Natal, reacendeu o alerta sobre a falta de segurança para ciclistas nas vias urbanas. Em entrevista, a doutora Isabel Magalhães, especialista em Gestão das Infraestruturas da UFRN, ressalta que, apesar dos investimentos em ciclovias e faixas exclusivas, a ausência de fiscalização rigorosa, a falta de educação no trânsito e a predominância de uma cultura que privilegia o automóvel continuam colocando em risco a vida de quem opta por outros meios de locomoção.

De acordo com a doutora, embora Natal tenha registrado avanços significativos na implementação de infraestrutura para pedestres e ciclistas, como faixas de pedestres em meio de quadra e ciclovias, os desafios relacionados à segurança persistem. Ela atribui essa dificuldade a uma cultura nacional que privilegia o uso de automóveis particulares, dificultando a plena integração de outros modais no trânsito. “Recentemente, temos observado um aumento nos investimentos em infraestrutura urbana, especialmente voltada para ciclistas e pedestres”, afirma Magalhães. “Há um crescimento na implementação de ciclovias, calçadas, faixas de pedestres e, inclusive, faixas em meio de quadra — aquelas que não estão localizadas em semáforos ou interseções, mas em pontos intermediários.”, complementou.

Ao comentar sobre a variedade de estruturas para ciclistas, a especialista observa que nem sempre as soluções implementadas são as mais adequadas. “Na Avenida Prudente de Morais, por exemplo, temos uma ciclorrota — uma via compartilhada entre ciclistas e ônibus. No entanto, é necessário refletir se essa é realmente a melhor alternativa para avenidas de grande movimento, como a Prudente de Morais ou a Hermes da Fonseca. Talvez o mais apropriado fosse uma ciclovia segregada, protegida por um obstáculo físico das demais faixas de rolamento”, sugere Magalhães.

Apesar desses avanços viários em Natal, ela ressalta que ainda existem desafios significativos relacionados à segurança no trânsito em Natal. “Infelizmente, essa não é uma questão exclusiva de Natal, mas um reflexo de um problema cultural enraizado no Brasil. Nossa sociedade ainda possui uma mentalidade fortemente rodoviarista, com foco no uso do automóvel particular”, explica.

Segundo Isabel Magalhães, não há um modelo padrão de infraestrutura ideal para todas as situações, pois cada via exige uma solução específica. Ela destaca que vias congestionadas, com fluxo intenso de veículos de grande porte e limites de velocidade elevados, não são indicadas para o tráfego de ciclistas.

No entanto, a especialista ressalta a importância de priorizar espaços seguros para ciclistas no ambiente urbano. Quando a opção é por vias compartilhadas, ela enfatiza a necessidade de garantir que os veículos trafeguem em baixa velocidade, com fiscalização rigorosa e conscientização dos usuários, de modo a preservar a segurança dos ciclistas no trânsito.

“Não existe um modelo único de infraestrutura ideal; o que deve ser levado em conta é o contexto de cada situação”, afirma a doutora Isabel Magalhães. Ela explica que, em vias congestionadas durante o horário de pico, onde o fluxo de veículos de grande porte é intenso e as velocidades regulamentadas variam entre 50 a 70 km/h, o trânsito de ciclistas se torna perigoso. “Nesses casos, o ideal seria que os ciclistas utilizassem rotas alternativas para garantir mais segurança”, aponta.

No entanto, ela reforça que é fundamental priorizar o espaço dos ciclistas nas vias urbanas e assegurar condições seguras para seu tráfego. “Quando se opta por uma via compartilhada, como uma ciclorrota, é essencial garantir que os veículos motorizados estejam trafegando em baixa velocidade”, alerta.

Isabel ressalta que, sem uma fiscalização efetiva e a devida educação dos usuários, a utilização correta dessas estruturas se torna improvável. Além disso, aponta que soluções adotadas em algumas avenidas, como as ciclorrotas compartilhadas com ônibus, podem não ser as mais seguras para vias de grande movimento, sugerindo a adoção de ciclovias segregadas como alternativa mais eficaz. “Se não houver fiscalização adequada e educação dos usuários das vias, dificilmente esses espaços serão utilizados de maneira correta e segura”, afirmou a especialista.


(Falta de) Educação no Trânsito


De acordo com Isabel Magalhães, não basta apenas oferecer infraestrutura adequada — é essencial que os usuários saibam utilizá-la corretamente. Ela destacou o caso da Avenida Prudente de Morais, onde a mudança na cor da sinalização horizontal gerou confusão, fazendo com que muitos acreditassem que a faixa exclusiva para ônibus e bicicletas havia sido removida, quando, na verdade, ela continuava ativa, apenas com uma nova pintura.

“Não basta apenas ter a estrutura física; é fundamental saber como utilizá-la”, ressalta a doutora. Ela menciona que, embora a cidade conte com sinalização horizontal e vertical adequadas, muitos usuários ainda não sabem interpretá-las corretamente. “Recentemente, a sinalização da Avenida Prudente de Morais, por exemplo, teve a cor da pintura alterada de vermelho para branco. Isso causou confusão em alguns motoristas e ciclistas, que passaram a acreditar que a faixa exclusiva para ônibus e bicicletas havia sido removida — o que não é verdade. A faixa permanece, delimitada por uma sinalização horizontal branca, mais larga, que continua definindo o espaço reservado para ônibus e ciclistas.”

Isabel também apontou a falta de treinamento e conhecimento por parte dos motoristas e ciclistas, reforçando que o Brasil ainda carece de uma cultura consolidada do uso da bicicleta. Segundo ela, é necessário investir em melhorias na infraestrutura, ampliar a fiscalização e, principalmente, promover a educação dos usuários das vias urbanas.

Ela também chama atenção para a falta de conhecimento sobre o uso correto dessas faixas compartilhadas. “Embora existam espaços de entrelaçamento, onde veículos podem acessar a faixa para conversão à direita, muitos motoristas não sabem como utilizá-los adequadamente, por falta de treinamento e educação no trânsito”, explica.

Isabel ainda ressalta que o problema vai além da sinalização e envolve uma questão cultural. “O Brasil, de maneira geral, não possui uma cultura consolidada do uso da bicicleta. A maioria dos ciclistas não recebeu uma educação formal sobre o uso das vias, e isso se reflete no comportamento dos usuários.” Para enfrentar esses desafios, ela defende um tripé de ações: “Precisamos melhorar a infraestrutura, intensificar a fiscalização e, principalmente, investir na educação dos usuários das vias urbanas”, conclui.


Fonte: Tribuna do Norte 

Foto: Reprodução