O assessor econômico da Fecomercio-SP, Fábio
Pina, diz que o resultado apresentado está “dentro de um contexto maior de
resultados fiscais”. Declara discordar da visão de parte dos economistas de que
o deficit seria justificável por acreditarem numa “função social” dos gastos
públicos.
“A FecomercioSP acredita que essa visão não seja a mais
adequada, sem discordar da importância dos serviços públicos. Todavia, o setor
público e suas empresas devem obedecer a uma lógica de eficiência e de
responsabilidade fiscal, sem a qual o efeito pode ser exatamente o oposto ao
desejado: perda de bem-estar através do esforço para se obter o equilíbrio
fiscal é que se alcança o benefício da redução dos gastos com juros (que são a
maior parte do deficit nominal)”, diz ao Poder360.
Pina também afirma que a busca pelo equilíbrio fiscal leva a uma “evidente
melhoria da gestão das empresas que não pode ser ignorada quando os recursos
são públicos”. Ecio Costa, economista e professor da UFPE (Universidade
Federal de Pernambuco), reforça que o resultado está associado a uma piora na
administração das estatais entre governos.
“Os dados mostram um reflexo de uma boa gestão de estatais
no governo anterior, que teve 3 de 4 anos com resultado positivos, enquanto nos
períodos anteriores e no atual governo, a gestão está mais precária”, afirma ao
Poder360.
PRINCIPAIS ESTATAIS
Ao levar em conta as principais estatais, o deficit
primário atingiu R$ 3,2 bilhões de janeiro a maio de 2024 –último dado
disponível ao detalhar as empresas–, de acordo com o 3º Relatório Bimestral de
Avaliação de Receitas e Despesas.
Criada para permitir o processo de privatização da
Eletrobras, a ENBPar (Empresa Brasileira de Participações em Energia Nuclear e
Binacional) apresentou um superavit de R$ 385,2 milhões no período. Esse valor
diz respeito à holding (responsável por controlar as subsidiárias) do grupo.
O Banco Central informou ao Poder360 que o resultado das
estatais federais inclui a empresa. O governo havia solicitado a retirada da
ENBPar da meta fiscal das estatais federais em 2024, sob a justificativa de que
a saída asseguraria mais investimentos.
Em contrapartida, 7 das principais empresas do governo
tiveram deficit até maio de 2024.
Os Correios registraram um rombo de R$ 1,5 bilhão. Houve
uma piora de quase R$ 900 milhões do acumulado até maio de 2024 ante o mesmo
período em 2023.
A Emgepron (Empresa Gerencial de Projetos Navais) teve
saldo negativo de R$ 651,3 milhões de janeiro a maio de 2024.
Apesar de os resultados consolidados das empresas estatais
nesta reportagem serem para o 1º semestre de 2024, quando as cifras são
divulgadas de forma individualizada por empresa, os dados vão só até maio de
2024.
Leia o infográfico abaixo com o resultado das principais
estatais federais de janeiro a maio de 2024:
OUTRO LADO
O Poder360 procurou por e-mail Correios, Serpro,
Dataprev, ENBPar, Hemobrás, Infraero, Emgepron e Nav Brasil para perguntar se
gostariam de se manifestar a respeito dos resultados apresentados até maio de
2024.
Correios, Dataprev, ENBPar, Hemobrás e Serpro encaminharam
nota a este jornal digital. Não houve resposta das demais até a publicação
desta reportagem.
O texto será atualizado caso uma manifestação seja enviada.
GESTÃO E INOVAÇÃO
O Ministério da
Gestão e Inovação encaminhou nota às 15h26 desta 2ª feira (5.ago.2024). O
ministério nega que os resultados apresentados pelas estatais federais no até
junho de 2024 representem “rombo”. Ao Poder360, disse que a perspectiva é
“totalmente diferente da lógica do Orçamento fiscal” e apresentar deficit “não
indica problemas de gestão”. Eis a íntegra do comunicado abaixo:
“Ao contrário do que publicou o site Poder360 em 4 de agosto de 2024, o
acompanhamento dos resultados primários das estatais não indica ‘rombo das
estatais’, uma vez que este acompanhamento usa a ferramenta orçamentária
(Programa de Dispêndios Globais), fazendo com que a lógica das empresas seja
totalmente diferente da lógica do orçamento fiscal do governo em geral.
“Portanto, o fato de as empresas não dependentes (que não
recebem recursos do Tesouro Nacional para sua manutenção) apresentarem deficit
não indica problemas de gestão. O dado reflete somente que dentro do exercício
de um ano, o total das saídas superou o total das entradas no caixa da empresa.
Estas saídas podem ser decorrentes de um maior volume de investimentos no
fortalecimento da empresa a longo prazo (como por exemplo as empresas que
receberam aportes feitos pela gestão anterior). Já as entradas no caixa são
feitas primordialmente a partir das receitas próprias de suas atividades.
“Neste ano, as estatais estão cumprindo, com bastante
margem, o que foi aprovado na Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei 14.791/24).
A Lei prevê um deficit orçamentário de R$ 7,3 bilhões e a última projeção, que
considera o que foi realizado até maio último, indica que elas devem fechar o
ano com deficit de R$ 4,2 bilhões. “Lembramos que o dado do semestre ainda é
parcial. Ano passado, por exemplo, inicialmente previsto em R$ 2,9 bilhões,
fechou em menos de R$ 200 milhões.”
CORREIOS
Em comunicado (íntegra – 40 kB), os Correios disseram que
têm “reserva de caixa” e que não necessitam de aportes do governo. A empresa
afirmou ainda que houve uma melhora de 22% no resultado líquido em 2023 e que
“medidas para redução de despesas estão em curso”.
“Historicamente, os indicadores do início do ano são mais baixos e aumentam no
decorrer do ano, o que se repetiu em 2024. A empresa ainda teve queda de
receita por conta da redução de encomendas internacionais e de mensagens”,
acrescentou.
DATAPREV
Em nota (íntegra – 51 kB), a Dataprev afirma que o
resultado negativo se dá por causa do “maior volume de saídas de caixa
acumuladas no período de janeiro a junho de 2024”. Diz ainda que o mau
desempenho foi apresentado, sobretudo, pela “queda conjuntural do volume de
recebimentos do faturamento de clientes em 2024 e ao pagamento de dividendos e
de Juros sobre Capital Próprio aos acionistas”.
ENBPAR
A empresa afirmou que está “empenhada” com ações que
assegurem uma administração eficiente. Eis a íntegra da nota:
“Referente ao Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas
Primárias do 3º bimestre de 2024, a ENBPar segue empenhada em implementar
medidas de gestão eficientes para manter a trajetória de crescimento, superando
os desafios. Embora o desempenho superavitário seja da holding, a ENBPar
continuará investindo em inovação, sustentabilidade e eficiência operacional
das Empresas do Conglomerado ENBPar para garantir a entrega de valor aos seus
acionistas e à sociedade.”
HEMOBRÁS
A Hemobrás afirma apresentar “lucro operacional recorrente
nos últimos anos” e que pagou mais de R$ 120 milhões em dividendos à União em
2022 e 2023.
Ao justificar o deficit primário no período, diz haver influência, sobretudo,
do “grande volume de investimentos” feitos no acumulado de 2024.
Eis a íntegra da nota:
“A Hemobrás é uma empresa que vem apresentando lucro
operacional recorrente nos últimos anos. Só nos últimos dois anos, foram mais
de R$ 120 milhões pagos em dividendos à União. Em relação ao resultado
primário, este é um indicador econômico que mostra a diferença entre receitas e
despesas primárias. A Hemobrás registrou déficit primário porque tem consumido,
em 2024, aportes recebidos em 2023 e em anos anteriores, e que já estão no
próprio caixa da empresa.
“Este resultado é influenciado, principalmente, pelo grande
volume de investimentos realizados no ano e considera:
“- Receitas primárias: venda de medicamentos, parcerias
tecnológicas e outras fontes de receita que não envolvem empréstimos ou
financiamentos;
“- Despesas primárias: custos operacionais, salários dos
funcionários, manutenção das instalações e investimentos em pesquisa e
desenvolvimento.
“Já em relação aos resultados financeiros da Hemobrás, a
empresa teve o maior desempenho econômico-financeiro de sua história no
exercício de 2023.O lucro chegou à casa dos R$ 326,5 milhões, superando o ano
de 2022 em 72,94%. As reservas constituídas foram ampliadas de R$ 112,7 milhões
em dezembro de 2022 para R$ 259,7 milhões em 2023.
“Com esse resultado, a Hemobrás pagou dividendos à União
pelo segundo ano consecutivo. Já o primeiro semestre de 2024 não teve sua
auditoria finalizada, mas dados preliminares apontam para um lucro de
aproximadamente R$ 30 milhões.”
SERPRO
O Serviço Federal de
Processamento de Dados encaminhou ao Poder360 uma nota às 11h56 desta 2ª feira
(5.ago.2024). Eis a íntegra abaixo:
“Em relação à
matéria publicada pelo Poder360 sobre o resultado financeiro das estatais
federais no primeiro semestre de 2024, esclarecermos alguns pontos importantes
sobre o desempenho do Serpro nesse período.
“Como já é esperado
a cada exercício financeiro, o comportamento sazonal entre as entradas e saídas
de caixa impacta no consumo de saldo no 1° semestre.
“A expectativa do Serpro é que o resultado primário apurado
no 2° semestre seja suficiente para equilibrar os resultados dos trimestres e
caminharmos para o encerramento do exercício com um superávit primário na ordem
de R$ 200 milhões.
“Estamos confiantes de que os trabalhos executados para a
otimização dos resultados e a gestão eficiente dos recursos permitirão ao
Serpro obter o equilíbrio das contas, além de contribuir positivamente para o
resultado consolidado das estatais federais ao final do ano corrente.”
Fonte: Poder 360
Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil